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Cotidiano

Artistas terão apenas duas celas na Cadeia Velha

Eles se rebelaram contra decisão de secretários. Uma CEV poderá ser instituída a partir de segunda

Carlos Ratton

Publicado em 27/01/2017 às 08:00

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A Cadeia Velha será ocupada por dirigentes da Agem que, em reunião fechada com cinco secretários, resolveram destinar pouco espaço aos artistas das nove cidades / Rodrigo Montaldi/DL

Em reunião fechada e sem alarde, dirigentes da Agência Metropolitana da Baixada Santista (Agem) e cinco secretários de cultura - Santos, São Vicente, Guarujá, Praia Grande e Cubatão – já definiram: somente duas celas do prédio da Cadeia Velha serão destinadas ao teatro, circo e dança e outras oficinas culturais de toda a região.

A informação foi postada ontem pelo secretário de Educação e Cultura de Cubatão, Raul Christiano, que usou seu perfil no Facebook para divulgar a reunião ocorrida na última quarta-feira sem a participação dos artistas e da imprensa.

Segundo Christiano, as duas celas no térreo do imóvel serão preparadas pelo Instituto Poiesis. “O agendamento será feito no local, para atividades artísticas, preferencialmente de quarta a domingo, dependendo da definição da cobertura dos custos operacionais apenas nos finais de semana”, postou o secretário, que foi diretor do Poiesis.

Ele revela que também ficou definido o uso da Sala Plínio Marcos para exposições e atividades que comportem público de até 120 pessoas, “concomitante com a programação de reuniões da própria Agem”.

Reação

Diante da decisão, integrantes do Movimento Cultural da Baixada Santista e artistas em geral reagiram por acreditarem que duas celas não serão suficientes para contemplar todas as atividades culturais.

Há também a informação que, na próxima segunda feira (30), haverá uma reunião na Câmara, com membros do Conselho de Cultura. A ideia é criar uma Comissão Especial de Vereadores (CEV) para discutir a ocupação da Cadeia. O movimento ainda prepara uma carta contraproposta.

“É pouco diante da necessidade da classe artística de ensaios, coletivos, reuniões. Há uma grande produção em teatro, música, cinema, dança, artes plásticas, literatura, enfim. As demais celas ficarão vazias? Isso é um remendo. Queremos de volta um centro cultural de artes integradas”, afirma o diretor de teatro Platão Capurro Filho.

“Não conversaram com a sociedade civil. Se fecham em reuniões inócuas na Agem para repetir o que já estava posto. Jogaram o diálogo no lixo. Isso é criminoso. Isso é um remendo muito mal feito. É chamar as pessoas de idiotas. O espaço é um centro cultural dada a vocação e identidade da construção do espaço durante anos de uma política pública que funcionava e atendia nove cidades. A reforma era para ter potencializado isso, como prometido na época do fechamento, e não retroceder”, dispara o ator e organizador do Curta Santos, Júnior Brassalotti.

“Vamos cobrar”

O diretor e ator Caio Martinez Pacheco, da Trupe Olho da Rua, reafirma que a Cadeia não pode perder a referência de ser um centro cultural pelo seu caráter histórico, museológico durante seus 35 anos. “Não fomos informados dessa reunião. A sociedade santista tem que continuar propondo ações culturais na Cadeia e exigir que as verbas que venham do Estado sejam para contemplar oficinas culturais. Vamos cobrar isso do Professor Fabião (secretário de Cultura de Santos) porque ele firmou um acordo com o movimento”, afirma.

Apelo de Cubatão

O diretor do Teatro do Kaos, de Cubatão, Lourimar Vieira, ressalta que a Cadeia Velha é de suma importância na formação dos artistas. Vieira lembra que em 1981 fez sua primeira oficina de teatro no prédio. “Várias iniciaram suas carreiras nesse importante equipamento público de cultura. Por isso, sou a favor de sua ocupação pelos artistas da região. Por favor, dirigentes públicos, um pouco mais de respeito com a história desse equipamento e com a dos artistas que lá se formaram. Respeitem a vontade dos artistas”, apela.

Puxadinhos

As atrizes Raquel Rollo e Miriam Vieira também questionam a decisão. “Duas celas para a demanda que os artistas de vários segmentos tem não dá conta de atender as necessidades e suprir a falta de espaço que temos na cidade e região”, afirma Raquel. “É pouco, quase nada! A Cadeia Velha pertence aos movimentos culturais da região! Tem a história e a memória artística. Não precisamos de puxadinhos oficiais para as nossas artes”, completa Miriam.

Afronta

A ex-secretária de Cultura de Santos, gestora cultural e atriz Naira Alonso afirma que o Estado afronta a cidade quando aponta para o fim da Cadeia Velha como ponto de referência e excelência cultural.

“Nossa luta por essa conquista teve início na década de 80 quando os artistas dessa cidade tomaram para si a responsabilidade de manter o espaço aberto e vivo. Os anos passaram, muitas lutas, projetos, programas, formação e difusão cultural se tornaram reais por detrás daquelas paredes. Lá resistimos contra os mandos e desmandos atrozes daqueles que consideram a cultura como assunto de terceiro escalão, os pobres de espírito, cegos, mudos e surdos burocratas. Como podem pensar que com somente uma caneta vão derrubar aquilo que levamos décadas para construir? Não vão! Não vamos nos calar, esmorecer, desistir”, garante.

Vergonhoso

O escritor Flávio Viegas Amoreira afirma ser “vergonhoso que oficinas culturais, essência da Cadeia Velha, se resuma a duas salas, como se fossem puxadinho da burocracia a arte e ensino da criatividade. Tinha 30 alunos até dezembro nesse espaço que ficaram orfãos de minhas oficinas literárias. Lecionava a noite mantendo a Cadeia sempre viva e muito frequentada. Repudio essa decisão e solicito uso total desse patrimônio para oficinas”, protesta.  

Desmonte

O músico Julinho Bittencourt acredita que não se trata de um caso isolado, mas sim, parte de um desmonte sistemático que o Governo Alckmin está promovendo em vários municípios do Estado. “Um desmonte na cultura. Em São José dos Campos, o prefeito do PSDB acabou com a sinfônica da cidade e quer acabar com a fundação Cassiano Ricardo. Em São Luiz do Paraitinga, não vai ter Carnaval esse ano. Em Santos, acabam com a Oficinas Pagú”, aponta.

Insensibilidade

O ex-vereador Evaldo Stanislau também resolveu se manifestar: “Talvez porque se preocupem em deixar espaço para ocupar com egressos da Lava Jato após a Odebrecht e que precisarão do espaço da antiga cadeia. Só isso explica tamanha falta de sensibilidade e visão estratégica no fomento à cultura. Aliás, o provincianismo e a postura cartorial de nossos ‘dirigentes’ certamente não refletem a nossa tradição cultural. Triste!”.

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