Paulista foi tomada por protestos nas últimas semanas / Fotos Públicas
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Os movimentos contra e pró-governo se intensificaram nas últimas semanas. A cobertura dos atos e dos fatos políticos são feitas em tempo real. Ao contrário de outros períodos históricos, onde a televisão, o rádio e o jornal impresso eram os únicos meios de comunicação, a internet ampliou os espaços de divulgação das notícias. O acesso à informação está maior, no entanto, o papel da mídia e dos jornalistas ainda é muito questionado com relação à influência na condução dos acontecimentos. O Diário do Litoral conversou com especialistas da Baixada Santista, que fizeram uma breve análise do tema.
“Qualquer processo político gera uma guerra de informação. Podemos abordar vários níveis para discutir o papel da mídia. O interesse das grandes empresas de comunicação, por exemplo, é, muitas vezes, econômico e político. E esses interesses ficam claros na produção das notícias. Se reflete muitas vezes na forma como as coberturas são produzidas”, explicou o professor e jornalista Marcus Vinícius Batista.
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Batista, que dá aulas de História do Jornalismo e Crítica à Mídia, em duas universidades da Região discorda do conceito imparcialidade. “O que deve existir é caráter, decência e equilíbrio. Vejo jornalistas cometendo erros e dizendo que são imparciais. O problema é muito sério. Se o jornalista não estiver bem preparado, ele é um cidadão acima de tudo, isso vai influenciar na postura dele”, afirmou.
Segundo o professor, a formação do profissional é importante. "Os cursos de jornalismo e os cursos de Humanas em geral estão adotando o tecnicismo do mundo de Exatas. Se investe na formação técnica do jornalista em detrimento do humano. A política tem muitas nuances. Se o jornalista não percebe que tem que ter posicionamento seguro, não estudar sempre e não ler, ele acaba sendo engolido pelo processo, o que é ruim”, destacou.
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Amor e ódio
Nas ruas o clima é de torcida. Os vestidos de verde e amarelo são contra o governo da presidente Dilma Roussef (PT) e propagam o discurso de combate à corrupção. Os de vermelho defendem o governo e discursam contra um possível golpe. Enquanto o primeiro grupo tem o juiz federal Sergio Moro como ícone do movimento, o segundo tem como referência o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT). O professor universitário também comentou a polarização dos movimentos do atual cenário político. O clima é de torcida e da luta do bem contra o mal.
“Não existem apenas dois lados. Existem muitos. Todo mundo produzindo informação como tática de propaganda de guerra, que é fazer com que as pessoas amem o seu lado e odeiem o outro, e, ao mesmo tempo, criam uma situação de ódio”, explica Batista, sobre o discurso de ódio acirrado nas ruas e nas redes sociais.
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Para exemplificar a relação de amor e ódio, o professor usou como referência personagens de filmes. “É ruim essa comparação, mas é coerente. Precisam personificar o amor e o ódio. Transformar esses símbolos em super-heróis. O que acaba simplificando e deixando de lado os pequenos vilões, os coadjuvantes do processo. A imprensa que hoje endeusa o juiz Sergio Moro em alguma momento vai bater. É ingenuidade acreditar que o juiz é o super-herói e Lula o vilão”, afirmou.
Apesar das ressalvas, o professor disse que há um lado positivo no cenário atual: “O lado bom, a evolução, é que a sociedade está falando de política”.
Pluralidade
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A tão sonhada imparcialidade no jornalismo também foi abordada pela professora e mestre em Comunicação e Semiótica Vanessa Ratton. Ela utilizou períodos da história da imprensa para analisar o atual cenário. Segundo a docente, o importante é preservar a pluralidade de pensamentos nos veículos de comunicação.
“Quando a imprensa surgiu ela já era parcial. Existia a imprensa a favor da república e a favor da monarquia, por exemplo. A polarização é histórica. Os movimentos sociais e políticos precisam de mídia para a sua voz. Infelizmente a imparcialidade é uma utopia”, disse Vanessa.
Segundo a professora, os veículos de comunicação precisam garantir a pluralidade de pensamentos em suas redações. “Se não tiver uma redação plural, garantir o espaço de pluralidade de pensamentos, sejam eles de direita ou esquerda, o veículo acaba tendencionando. Antigamente as pessoas enxergavam o mundo por meio da televisão, hoje temos as redes sociais com uma pluralidade de informações e não apenas o que a mídia apresenta”, explicou.
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Para exemplificar seu posicionamento, a professora utilizou o exemplo do copo. “Quando olho para um fato olho com a minha cultura, a minha bagagem de conhecimento. É como um copo com água pela metade. Há quem fale que está meio vazio e quem diga que está meio cheio. As duas coisas estão certas, porém cada um vê pelo seu ponto de vista”, ressaltou.
Era da informação
Para o jornalista Michel Carvalho, mestre em Ciências da Comunicação e doutorando em Ciências Humanas e Sociais, a ampliação dos canais de comunicação não significa o aumento do conhecimento. Segundo ele, o jornalismo precisa ser criterioso na divulgação das informações.
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“Vivemos a Era da Informação, o que infelizmente não significa necessariamente a Era do Conhecimento. Muitas mensagens circulam pela internet e nem sempre elas são verdadeiras. Como pode o cidadão comum, aquele não institucionalizado, distinguir, num volume pulverizado de informação, entre aquela confiável, verídica e relevante, e aquela errônea, imprecisa e falsa?”, questiona Carvalho.
Segundo ele, o jornalismo tem papel fundamental nesta intermediação. “Em tese, o jornalismo ajudaria esse cidadão a fazer essa distinção. No entanto, estamos diante de um quadro, em que tudo parece simulacro. Só podemos ter uma melhor compreensão do que ocorre se houver uma imprensa comprometida com o interesse público e o respeito ao Estado de Direito. É preciso que os jornalistas sejam criteriosos ao divulgar uma determinada informação”, afirmou.
Carvalho disse que dentro dessa nova percepção, a formação do novo jornalista deve levar em consideração a geração. “Temos uma geração de novos jornalistas, que já nasceram na Era da Cibercultura, o que tem reflexos na escrita, na leitura e principalmente na percepção do outro. O jornalista não pode perder esse olhar curioso e atento sobre o ser humano. Temos hoje uma geração de profissionais que só entrevista por e-mail ou pelas redes sociais, ou pior, quando escreve uma matéria a partir dos comentários feitos por uma figura pública nas redes sociais. O jornalista não pode reproduzir o senso comum nem cair nesse binarismo que predomina nas redes sociais, em que facilmente se elege heróis e vilões, bem e mal”, explicou.
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