A casa do Papai Noel recebe visitações de turistas do mundo afora / Pexels
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Se você cresceu no Brasil, certamente já se pensou que "todo mundo fosse filho de Papai Noel". Mas, o que parece uma rima infantil de Natal, na verdade, é uma das críticas sociais mais ácidas e melancólicas da nossa música.
Em 1932, o compositor baiano Assis Valente decidiu quebrar o encanto natalino em sua canção "Boas Festas", no qual ele decretou que o bom velhinho "com certeza já morreu", dando voz a todos aqueles que o Natal insiste em esquecer.
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A ironia de Valente é fantástica e atemporal. Enquanto o comércio vende a ideia da felicidade plena, ele a define como um "brinquedo de papel", algo frágil, que rasga no primeiro sinal de realidade.
Composta em um quarto solitário de pensão no Rio de Janeiro, a música nasceu da observação crua de quem via a festa passar pela janela, sem ser convidado. Para o autor, o Natal não era sobre renas ou neve, mas sobre a ausência de quem "já faz tempo que eu pedi, mas o meu Papai Noel não vem".
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Essa ousadia lírica atravessou gerações. Foi imortalizada pela voz de trovador de Carlos Galhardo nos anos 1930 e ganhou uma roupagem psicodélica e rebelde com os Novos Baianos em 1973.
No auge da ditadura militar, misturar o lamento de Assis Valente com o peso do rock foi uma forma de lembrar que, sob o brilho das árvores de Natal, o país ainda buscava uma felicidade que não fosse descartável.
O segredo do sucesso de "Boas Festas" é que ela é honesta. Ela fala com o cristão, com o agnóstico e até com o ateu que, entre um panetone e outro, sente aquele aperto no peito pela efemeridade da festa.
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Ao "matar" Papai Noel na letra, Assis Valente acabou criando algo imortal: um hino para quem sabe que a verdadeira celebração está em reconhecer que a felicidade é difícil de alcançar, mas que "é impossível ser feliz sozinho".
Se nem todo mundo é filho de Papai Noel, pelo menos todo mundo tem essa canção para se sentir menos só. Ouça abaixo!
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