Há exatamente cem anos, em 1925, ao ser entrevistado por um jornal no Rio de Janeiro, Coelho Neto sintetizou as suas lutas de escritor. Dia e noite a escrever, molhando a pena no tinteiro e produzindo suas obras. A escrever, sempre a escrever, para sustentar a família e educar os filhos.
Ao ser indagado sobre quantos volumes já havia publicado até então, ele, acanhado e constrangido, após um momento de hesitação respondeu:
- “102!”.
O repórter ficou espantado:
- “102? É verdade que, entre novelas e contos, o senhor já escreveu mais de trezentos?”
- “Um pouco mais: 580”.
Todo esse magnífico acervo era insuficiente para fazê-lo um pai de família financeiramente tranquilo. Continuava a ser um homem pobre. Via-se obrigado a procurar editoras para publicar seus livros e espalhar crônicas e contos pelos jornais, em busca de alguns vinténs.
O repórter indaga, curioso:
- “A casa em que mora é sua?”.
- “Não. Habito-a há exatos vinte anos, como inquilino”, respondeu Coelho Neto. E lembrou-se do jazigo de família, onde já repousava seu filho Mano:
- “Casa própria, tenho-a no cemitério: a que foi doada a meu filho. Não sou tão pobre assim: tenho pelo menos onde cair morto!”
Essa frase, ou algo muito parecido, era também repetida por Lygia Fagundes Telles, bi-acadêmica: da Academia Brasileira e da Academia Paulista de Letras. Sempre brincava: - “Sou bi-imortal porque não tenho onde cair morta!”. Consta que foi Olavo Bilac o primeiro a fazer essa blague, que tem um pouco de verdade. Quem ganha dinheiro com livro no Brasil? Um país que perde milhões de leitores a cada ano, engolidos pelas redes antissociais em que prepondera a piada, o mau gosto, a chulice e a bobagem.
Enquanto esta Pátria não se educar – e com qualidade e consistência – os talentos continuarão a passar fome, enquanto as imbecilidades prosseguirão em seu trajeto ascensional.