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Um milhão de indígenas buscam alternativas para sobreviver

"O Congresso Nacional conservador representa a maior ameaça aos direitos dos povos indígenas, afirmou o antropólogo Stephen Baines

Agência Brasil

Publicado em 23/04/2018 às 12:44

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Alguns povos indígenas que tiveram suas terras homologadas têm conseguido bons resultados por meio da comercialização de seus produtos / Rodolfo Oliveira/Ag. Pará/Fotos Públicas

Há, no Brasil, cerca de 1 milhão e indígenas de mais de 250 etnias distintas vivendo em 13,8% do território nacional. Em meio às ameaças de violência, riscos de perda de direitos em decorrência da pressão dos latifundiários, mineradoras e usinas, alguns povos indígenas lutam por mais autonomia, tentando conquistar, com a comercialização de seus produtos e com o turismo, alternativas para diminuir a dependência dos recursos cada vez mais escassos da Fundação Nacional do Índio (Funai).

Segundo especialistas consultados pela Agência Brasil, estes são alguns dos principais desafios a serem lembrados na semana onde foi comemorado o dia do índio.

Para serem bem-sucedidos, nessa empreitada visando a venda de suas produções e a exploração dos recursos naturais das terras indígenas (TIs), os povos indígenas têm como desafio buscar maior representatividade no Congresso Nacional, uma vez que cabe ao Legislativo Federal criar políticas específicas que deem segurança jurídica para que eles consigam o desenvolvimento financeiro do qual sempre foram excluídos.

Sustentabilidade

Alguns povos indígenas que tiveram suas terras homologadas têm conseguido bons resultados por meio da comercialização de seus produtos. Levantamento apresentado à Agência Brasil pelo Instituto Socioambiental (ISA) aponta que, somente na safra 2017/2018, índios da etnia Kaiapó do Pará obtiveram cerca de R$ 1 milhão com a venda de 200 toneladas de castanha. Outros R$ 39 mil foram obtidos com a venda de sementes de cumaru, planta utilizada para a fabricação de medicamentos, aromas, bem como para indústria madeireira.

A castanha rendeu aos Xipaya e Kuruaya, no Pará, R$ 450 mil, dinheiro obtido com a venda de 90 toneladas do produto. Cerca de 6 mil peças de artesanato oriundo das Terras Indígenas do Alto e do Médio Rio Negro renderam R$ 250 mil aos índios da região. Já os indígenas da TI Yanomami (Roraima e Amazonas) tiveram uma receita de R$ 77 mil com a venda de 253 quilos de cogumelos.

Autonomia

O presidente da Funai, general Franklimberg Ribeiro Freitas, disse que cabe aos indígenas a escolha do modelo de desenvolvimento a ser adotado. “A Funai deve apoiá-los para atingir seus objetivos”, afirmou à Agência Brasil. “Em diversas regiões, os índios estão produzindo visando à comercialização de seus produtos ou mesmo serviços, como o turismo ecológico. Essas experiências mostram que a extração sustentável, a comercialização de produtos e o turismo podem ajudar a ampliar o desenvolvimento das Terras Indígenas”, disse o presidente do órgão indigenista.

Franklimberg destacou que entre as etnias que produzem e avançam na comercialização de produtos e serviços estão os Kaiapós do Pará. “Eles produzem toneladas de castanha e agora reivindicam máquinas para beneficiar o produto”, ressaltou. “Há também o cultivo e a venda de camarão, pelos Potiguara da Paraíba, que está bastante avançada. Tem até a lavoura de soja dos Pareci, no Mato Grosso”.

O presidente da Funai acrescentou ainda que: “No caso do minério e dos recursos hídricos, é preciso ainda normatizar e regulamentar essas atividades, o que cabe ao Congresso Nacional fazer”.

Congresso Nacional

Para o antropólogo e professor da Universidade de Brasília Stephen Baines, os indígenas são preteridos na relação com os empresários e donos de terras. “Há uma desproporção absurda no Legislativo brasileiro a favor daqueles que querem o retrocesso dos direitos dos povos indígenas, previstos na Constituição de 1988 e na legislação internacional”, disse.

“Temos atualmente um Congresso Nacional extremamente conservador que representa – por meio de parlamentares ligados à bancada ruralista, ao agronegócio, às empresas de mineração e aos consórcios de mineração e de usinas hidrelétricas – a maior ameaça e o maior ataque aos direitos dos povos indígenas”, afirmou o antropólogo.

Segundo Baines, é difícil para os índios planejar grandes voos do ponto de vista de recursos, sem que, antes, seja resolvida a questão da gestão territorial, o que inclui a segurança jurídica que só é possível a eles após terem suas terras demarcadas e homologadas.

Violência

Stephen Baines afirmou que a violência contra os índios ainda é intensa em várias comunidades, como nos estados do Pará, Mato Grosso e Roraima. “Há muitas ameaças contra os índios, feitas por latifundiários, empresas e pelos capangas, que matam lideranças locais que lutam pelos seus direitos. Quer saber onde os índios correm mais riscos? Basta olhar para as terras indígenas que estão próximas a latifúndios”, disse.

Baines citou como exemplo o ocorrido na Terra Indígena Raposa Serra do Sol (RR), onde fazendeiros que vieram de outras regiões se instalaram. “Eles invadiram as áreas indígenas para desenvolver produção industrial de arroz. Para expulsar os índios da região, usavam capangas. Até indígenas foram pagos por eles para intimidar as lideranças”, afirmou. “Atualmente, muitos daqueles invasores são atualmente influentes políticos locais e federais e, com a ajuda da mídia, passam a falsa ideia de que há muita miséria entre os indígenas. Os indígenas negam isso, mas não conseguem espaço na mídia para desmentir a história falsa.”

À Agência Brasil, o integrante da Frente Parlamentar da Agropecuária e líder do PSDB na Câmara, deputado Nilson Leitão (MT), disse que “nenhum projeto” aprovado pelo Congresso Nacional traz prejuízos aos interesses dos indígenas. “Pode ir contra o interesse de intermediários, interventores ou organizações sociais, que dizem trabalhar para o índio. Nenhum deputado que eu conheço, que defenda o setor produtivo, trabalha contra o índio”, disse.

Nilson Leitão afirmou que o “verdadeiro parceiro do índio são os produtores”. “[Indígenas e produtores] são vizinhos, moram na mesma localidade, têm as mesmas peculiaridades e colaboram um com o outro. Não existe conflito entre eles a não ser aqueles provocados por organizações sociais”, disse.

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