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Bolsonaro favorece empresas com subsídio à energia solar

Para especialistas do setor, o governo adotou uma posição populista ao encampar o discurso de não "taxar o sol"

Folhapress

Publicado em 08/01/2020 às 12:12

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Segundo estimativa do Ministério da Economia, o subsídio vai custar ao consumidor R$ 34 bilhões até 2035 / Divulgação

A manutenção das regras do setor de energia solar, promovida pelo próprio presidente Jair Bolsonaro, favorece especialmente grandes empresas, como banco, telefônicas, redes varejistas e companhias do agronegócio.

Para especialistas do setor, o governo adotou uma posição populista ao encampar o discurso de não "taxar o sol", quando o debate não previa a criação de tributo, mas a eliminação de um subsídio, que eleva a conta de luz de todos os consumidores do país.

Segundo estimativa do Ministério da Economia, o subsídio vai custar ao consumidor R$ 34 bilhões até 2035. Ainda assim, nesta terça (7), Bolsonaro se reuniu com a Aneel (Agência Nacional de Energia Elétrica) e disse que o debate acabou. O subsídio fica.

A proposta da Aneel, apoiada pelos ministérios de Minas e Energia e Economia, criaria um cronograma para pôr fim à isenção, adotada em 2012, pelo uso da rede transmissão. A medida buscava incentivar a expansão da geração distribuída de energia solar -também chamada de GD.

"Há um equívoco terrível nessa discussão. Ninguém quer taxar o sol. Isso foi uma jogada inteligente que o pessoal da energia fotovoltaica criou", diz o consultor Adriano Pires, do CBIE (Centro Brasileiro de Infraestrutura).

O modelo atual isenta casas e empresas que atuam como geradores de GD do pagamento de encargos e uso da rede de distribuição e transmissão.

Dados da Aneel mostram que há cerca de 163.066 unidades produtoras de geração distribuída hoje no país, que fornecem energia a 217.747 unidades consumidoras. Elas têm uma potência instalada de 2.054 MW (megawatts).

Embora os consumidores residenciais representem o maior número de unidades (118.053), o comércio possui a maior potência instalada: 825 MW. Já o agronegócio e a indústria têm pouco mais de 200 MW cada um.

A geração pode ser instalada nas próprias unidades consumidoras ou em espécie de condomínios ou fazendas de energia solar que produzem energia para diversos clientes.

A lista das empresas com maiores potências em geração distribuída no Brasil é liderada pela Bom Futuro Agrícola, empresa da família Maggi, e pela telefônica Claro, com 16 MW cada uma. Entre os 20 primeiros, há bancos, como o Santander e a Caixa Econômica Federal, empresas de varejo (Sendas Distribuidora, Magazine Luiza e Lojas Americanas) e outras companhias do agronegócio, como a JBS.

Segundo a Aneel, cerca de um quinto da capacidade é gerado longe das unidades consumidoras, nos condomínios ou fazendas, no modelo conhecido como geração remota. Embora dependam da rede de transmissão, são beneficiados pelas regras atuais.

"A autogeração remota virou um modelo de negócios. Uma empresa constrói uma unidade no norte de Minas Gerais, por exemplo, e entrega a uma rede de farmácias em Belo Horizonte", diz Lavínia Holanda, sócia-diretora da Escopo energia. Ela destaca que mesmo consumidores com painéis no telhado usam a rede: jogam energia durante o dia e recebem durante a noite. "É um serviço e, como tal, tem que ser pago", diz.

Lavínia afirma que, se o governo quer incentivar a energia solar, tem opções melhores: "Pode criar subsídio claro e transparente, pago pelo contribuinte [via Tesouro], e não pelo consumidor de forma disfarçada", diz.

Os especialistas ouvidos pela Folha de S.Paulo concordam que o incentivo foi importante, mas que, com a queda no custo dos painéis e o encarecimento da conta de luz -porque o volume de subsídio cresce com a expansão do setor–, é hora de rever o modelo.

"Em todos os países que estudamos, o órgão regulador, com o crescimento da geração distribuída, impôs cobrança pelo uso da rede", diz o professor Nivalde de Castro, do Gesel (Grupo de Estudos do Setor Elétrico) da UFRJ.

Cerca de 40% da conta de luz do país refere-se à compra de eletricidade, diz Pires. O restante são encargos, impostos e uso de redes de transmissão e distribuição. É essa parcela que está em debate: quanto maior for o crescimento da GD, maior será a parcela dividida. "O modelo atual é tipo Robin Hood ao contrário, diz ele. "Está transferindo dinheiro do pobre para o rico, que é quem tem dinheiro para comprar painel solar."

Em nota divulgada nesta terça, a Abradee (Associação Brasileira das Empresas de Energia Elétrica) calcula que o subsídio cruzado chegará, em dois anos, a R$ 2,5 bilhões, concedidos a pouco mais de 600 mil beneficiados.

"Para ter uma ideia, o valor será maior do que o desconto na tarifa social para a baixa renda, que reúne 9 milhões de pessoas", diz o texto.

Defensora da manutenção do modelo, a Absolar (Associação Brasileira da Energia Solar Fotovoltaica) avaliou o pagamento da transmissão.

Guilherme Susteras, coordenador do grupo técnico da entidade, diz que autoprodutor deveria pagar, sim, mas entre 10% e 15% da tarifa, e não 60%, "como quer a Aneel". "É justo pagar até 15% quando o mercado chegar a um nível de maturidade, calculamos que em dez anos. É quando o mercado vai atingir esse custo. Defendemos que existe um valor justo para o uso da rede e um momento adequado."

Ele alega ainda que os condomínios de geração distribuída já pagam tarifas à distribuidora. "Os condomínios solares pagam a tarifa de distribuição, que é muito cara."

E admite: "Essa discussão de subsídio e taxação é jogo de palavras que poluíram o debate", diz.

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