Artigo

Porto e cidade: a urgência de uma governança compartilhada

O que falta não é diagnóstico, é decisão. E sobretudo, vontade política

Caio da Marimex

Publicado em 18/06/2025 às 14:51

Atualizado em 18/06/2025 às 14:52

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Caio da Marimex / Divulgação

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Muito se fala sobre o potencial do Porto de Santos como motor da economia nacional, mas pouco se discute, de fato, sobre o seu entrosamento com a cidade que o abriga. Reforço, com certa resignação, que, em Santos, o entrosamento porto-cidade não existe. O que falta não é diagnóstico, é decisão. E sobretudo, vontade política. 

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Ao longo das últimas décadas, observamos um distanciamento crescente entre as estruturas decisórias do setor portuário e os interesses reais da população santista. A cidade convive diariamente com os efeitos da atividade portuária — do trânsito pesado à degradação ambiental — sem que haja, em contrapartida, uma governança que garanta planejamento urbano, mitigação de impactos ou investimentos sociais vinculados ao porto.

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Enquanto isso, exemplos internacionais demonstram que outro caminho é possível. Em Roterdã, o maior porto da Europa, a autoridade portuária opera em regime de empresa pública de capital misto, com participação da cidade e da iniciativa privada. Há conselhos deliberativos com representantes do governo local, comunidade e setor produtivo. Em Barcelona, o projeto “Port Vell” transformou a zona portuária em espaço urbano multifuncional, respeitando a operação logística, mas devolvendo áreas estratégicas à cidade.

Essas experiências revelam um ensinamento fundamental: integração não é obra do acaso — exige modelo de governança compartilhada, metas de desenvolvimento integrado e transparência. A lógica da segregação funcional — em que porto e cidade operam como compartimentos estanques — não se sustenta diante dos desafios urbanos do século XXI.

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No caso de Santos, urge avançar em três eixos: (1) instituir uma mesa permanente de diálogo entre prefeitura, Autoridade Portuária, operadores e sociedade civil organizada; (2) vincular parte das receitas portuárias a investimentos urbanos — seja por meio de um fundo de compensação, seja via convênios específicos; e (3) fomentar projetos urbanísticos que revitalizem áreas degradadas, convertendo-as em espaços produtivos ou de convivência, como já ocorre em diversos portos requalificados na Europa e na Ásia.

Essa integração não deve ser apenas física ou orçamentária — precisa ser estrutural e estratégica. O planejamento de novas vias, modais logísticos e acessos ao porto deve incorporar o impacto urbano como critério essencial, precedido por audiências públicas efetivas, e não meramente protocolares. A cidade precisa ser chamada a co-construir o futuro do seu principal ativo.

Reafirmo: o Porto de Santos não pode prosperar isolado da cidade. E Santos não pode traçar seu futuro alheio ao porto. É preciso superar a dicotomia porto versus cidade e reconhecer que somos parte de um mesmo organismo. Cada decisão portuária reverbera no tecido urbano; cada omissão urbana compromete a eficiência logística.

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Entendo que o setor privado também deve assumir seu papel nesse debate. É responsabilidade dos terminais e operadores logísticos investir na relação com o entorno, fomentar a educação técnica, gerar empregos dignos e atuar com responsabilidade social e socioambiental.

O Brasil precisa de portos competitivos — mas precisa, igualmente, de cidades inteligentes, que se desenvolvam de maneira equilibrada e sustentável. É hora de tratarmos porto e cidade como parceiros de um mesmo projeto de nação.

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