Nilton César Tristão, cientista político / DIVULGAÇÃO
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Hoje não escreverei sobre política partidária ou discorrerei sobre como o bolsonarismo tornou-se o gatilho que potencializa os instintos primitivos no ser humano. Ao contrário, pretendo refletir a respeito das maneiras de assossegar o espírito diante dos infortúnios desencadeados pelo evento viral da covid-19.
Segundo matéria divulgada por Bárbara Muniz Vieira no Portal G1 e Jornal da Globo em 08/04/2021: “Número de mortes ultrapassa pela primeira vez na história o de nascimentos na região sudeste do país na 1ª semana de abril”. No sítio do Monitor Mercantil na data de 04/05/2021, pode-se ler: “Em nove capitais, o número de óbitos superou o de nascidos vivos, sendo que em quatro delas isso ocorre pela primeira vez desde o início da contagem, em 2003...”.
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Não há dúvidas de que o passamento de amigos, parentes, vizinhos, conhecidos e demais entes queridos converteu-se em fato corriqueiro no cotidiano de nosso povo. Excetuando aqueles indivíduos que adotaram a insensibilidade e indiferença perante o arrebatamento precoce que acometeu mais de quinhentos mil compatriotas, os cidadãos normais tendem a desenvolver sentimentos intensos de dor, associados principalmente à perda do convívio afetivo e à desorientação diante do futuro incerto.
Por estranho que possa parecer, além das crenças religiosas, a física de partículas que estuda as interações e flutuações quânticas como catalizadoras de realidades alternativas no mundo elementar, notadamente nas questões intrínsecas à descontinuidade temporal, pode conferir algum tipo de alento.
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Carlos Rovelli, cosmologista italiano, defende a inexistência do tempo; em que pese suas concepções não avançarem para além da relatividade de Albert Einstein ou aprimorarem as conjecturas de Stephen Hawking, reforçam a ideia contraintuitiva de que o postulado da linearidade ou flecha do tempo pode ser meramente uma ilusão das experiências sensoriais.
Em outros termos, passado, presente e futuro coexistem a partir de construções probabilísticas quase infinitas, dentro de múltiplos eventos históricos, com ciclos de casualidades conhecidos ou completamente obscuros à nossa vivência. O porvir e o pretérito subjazem, segundo sua concepção, enquanto processo paralelo e continuado no eixo cronológico, a partir da infinidade de possibilidades ocorridas dentro de coesões algorítmicas.
Não podemos nos esquecer que Galileu Galilei (1564-1642) disse: "A matemática é o alfabeto no qual Deus escreveu o universo". Esse delineamento teórico pode nos levar à conclusão de que somos uma linhagem de seres com propósitos atemporais e reféns do incomensurável. Para tanto, observe o diálogo entre Jonas e o relojoeiro no seriado alemão Dark: “Quero saber se é possível mudar o tempo, se tudo tem um propósito e quem decide esse propósito? Coincidência? Deus? Ou nós mesmos? Somos livres em nossas ações? Ou será que tudo é criado de novo em um eterno ciclo? E nós apenas seguimos as leis da natureza e somos escravos do tempo e do espaço?”.
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Claro que tal abordagem coloca em cheque o próprio sentido de livre arbítrio, mas nos confere a sensação de imortalidade. Acho reconfortante acreditar que aqueles que partiram dessa dimensão mantenham suas jornadas de vida em outros lugares.
Mas nesse contexto uma dúvida se manifesta em meu âmago: somos servos da imposição dos paradoxos ou exatamente o contrário? Representamos frutos da “contradição deduzida no seio dos sistemas lógicos” ou significamos o ajuste de causas e efeitos para a manutenção de informações e objetos na intricada teia de conexões temporais (paradoxo de bootstrap)? Na próxima semana voltaremos a abordar temas políticos.
* Nilton César Tristão, cientista político
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