Silvio Sebastião Pinto, Analista Programador e Escritor / DIVULGAÇÃO
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Por Silvio Sebastião Pinto
Hoje eu fui tomar café na minha cozinha, e ao puxar a cadeira para me sentar notei que ela já está bem velha e soltando uma cola. Aí me veio um pensamento ultramoderno e adaptado à subserviência consumista de troca-la por outra, novíssima. Sim, é isso que as pessoas fazem com frequência cada vez maior, vão trocando tudo. Tudo precisa ser novo para nos dar a sensação de que serão para sempre. A juventude nos passa a ideia de força e eternidade.
Mas em seguida me veio um pensamento mais conservador, o de que o maior charme da Itália e da França são justamente suas relíquias restauradas. Seus castelos centenários, suas pontes lindamente debruçadas sobre águas antigas, bonitas vielas cheias de casas velhas com flores nas janelas. Então eu me perdi nesse devaneio tolo sobre o real valor das coisas. A atmosfera do mar está corroendo a lata da minha geladeira, do fogão e do armário, e com isso estou sempre pensando se devo ou não trocar tudo por tecnologias mais modernas.
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As tecnologias são altamente descartáveis, sabemos disso. O carburador deu lugar à injeção eletrônica, as máquinas fotográficas foram substituídas por celulares, e as baterias de eletrônicos são descartadas assim que perdem a carga. E infelizmente essa prática está nos reconfigurando para descartar tudo que está ao nosso redor. Assim, tudo o que fica velho entra no corredor dos nossos desafetos, e pensamos logo em trocar por uma versão mais nova.
Isso é ruim, pois o mesmo sentimento que desenvolvemos para com as coisas também é muitas vezes empregado às pessoas. A velocidade com que a vida tecnológica acontece acaba nos causando esse tipo de confusão. Por isso o desrespeito aos mais velhos tem se tornado cada vez mais visível no seio das famílias. E isso piora um pouco mais quando os filhos, netos e sobrinhos são criados a longas distâncias dos anciãos da família.
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Gastamos tempo demais com o pescoço envergado sobre o celular, movimentando os dedos, alimentando ‘contatos’ distantes, e assim descartamos relacionamentos incríveis. Penso que no nosso profundo inconsciente tentamos nos afastar das coisas velhas ou deterioradas para nos prevenirmos de nos tornar como elas, o que é um engano estúpido.
Descarte coisas, mas cuidado para não descartar pessoas. Restaure suas cadeiras e mesas gastas pelo tempo, elas podem fazer parte de uma bonita história que você está escrevendo. Mas lembre-se de restaurar também, e todo dia, os seus relacionamentos familiares. Não permita que o ciclo alucinado das tecnologias determine a maneira como você vive com as pessoas ao seu redor. Os relacionamentos podem ser reciclados indefinidamente, e podem ficar cada vez mais charmosos, como as centenárias e charmosas vilas italianas.
Além de comprar fogão novo e geladeira ultratecnológica talvez devamos comprar também flores para cultivar o sorriso de quem amamos.
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* Silvio Sebastião Pinto, analista programador e escritor