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Artigo - Moby Dick e o capitão

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Publicado em 06/03/2021 às 10:10

Atualizado em 06/03/2021 às 15:13

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Em Moby Dick, só um tripulante, Ishmael, sobreviveu para contar a história / REPRODUÇÃO

Por Francisco Marcelino

Assim que o Carnaval acabou, mergulhamos na mais longa Quarta-Feira de Cinzas de nossa história. Entramos na Quaresma para nos esquecermos dos excessos do Carnaval. Mas, este ano, não será possível esquecê-los diante das mortes. Mesmo sem a realização de desfiles, blocos, concursos de fantasia, o Carnaval de 2021 teve os seus excessos. É o que vimos no Morro do Vidigal, no Rio de Janeiro, é o que vimos em São Francisco do Sul, em Santa Catarina, onde, sem máscara, um certo capitão provocou aglomeração. 

Na sua sanha de espalhar perdigotos, o presidente Jair Bolsonaro se assemelha cada dia mais a um outro capitão que foi consumido pela vingança: o fictício Ahab, comandante do baleeiro Pequod. O ensandecido Ahab e sua tripulação partem de Nantucket, no estado norte-americano de Massachusetts, em busca de Moby Dick, um cachalote branco que decepara uma das pernas do capitão. Na perseguição a Moby Dick, Ahab encontra uma trilha de destruição e mortes narradas pelos comandantes de outros baleeiros. Mesmo assim, ele não consegue parar.  

A Bolsonaro, porém, falta o canibal polinésio Queequeg, um dos três arpoadores do Pequod. Faltam também os dois outros arpoadores, o nativo norte-americano Tashtego e o africano Daggoo. Por isso, é Bolsonaro mesmo quem atira os arpões à torta e à direita: “Chega de frescura, de mimimi. Vão ficar chorando até quando?” Para ele, não importam quantos morrerão. O que importa é acabar com Moby Dick. Resta saber quem é a Moby Dick do capitão Bolsonaro. Assim como Ahab, que ao perseguir Moby Dick desistiu de cumprir seu contrato com os donos do Pequod, Bolsonaro abdicou de seu dever constitucional. Assim, ele leva o barco Brasil à beira do precipício da sua Terra Plana.  

Na nossa longa Quarta-Feira de Cinzas, temos cerca de 260 mil mortos. Apenas em Santa Catarina, estado, vale lembrar, onde o nosso Ahab passou o Carnaval, há quase 300 pacientes com Covid-19 esperando por um leito de UTI. Com seu sistema de saúde em colapso, fato que já tínhamos visto no Amazonas, os pacientes catarinenses são transferidos para o Espírito Santo. O problema é que, pelo andar da carruagem, é quase certo que em breve não haverá mais vagas em outros estados. Sim, é bem provável que piore muito antes de... estabilizar.

No século XIX, época em que se situa a narrativa de Moby Dick, a tripulação do Pequod tinha praticamente um recurso contra o ensandecido capitão Ahab: o motim. Felizmente, não vivemos no século XIX. Temos um arsenal de mecanismos democráticos para encerrar essa narrativa: impeachment, interdição por incapacidade, denúncia no Tribunal Penal Internacional.   
 
Em Moby Dick, só um tripulante, Ishmael, sobreviveu para contar a história. Mesmo assim, só se salvou porque usou o caixão do amigo Queequeg como boia. 

Francisco Marcelino, jornalista, escritor e professor

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