Artigo

Aniversário de 35 anos do SUS: celebrar e defender

Ao longo dessas três décadas e meia, o SUS construiu conquistas concretas que transformaram a vida da população

Fábio Mesquita

Publicado em 23/09/2025 às 17:16

Atualizado em 23/09/2025 às 17:22

Compartilhe:

Compartilhe no WhatsApp Compartilhe no Facebook Compartilhe no Twitter Compartilhe por E-mail

Celebrar o SUS é também reconhecer suas contradições / Fernando Frazão/Agência Brasil

Continua depois da publicidade

Em setembro de 2025, o Sistema Único de Saúde está completando 35 anos. Mais do que uma política pública, o SUS é um marco civilizatório brasileiro: a inscrição do direito à saúde como dever do Estado. 

Faça parte do grupo do Diário no WhatsApp e Telegram.
Mantenha-se bem informado.

Sua criação foi fruto da luta da Reforma Sanitária, da mobilizaçãode trabalhadores da saúde, sanitaristas, estudantes e militantes que ousaram sonhar comum país onde o cuidado não fosse privilégio de poucos. 

Continua depois da publicidade

Leia Também

• CPF será único identificador no SUS e 111 milhões de cadastros serão inativados

• Planos de Saúde começam a atender pacientes do SUS

• Governo de SP inclui hospitais municipais na Tabela SUS Paulista; entenda a iniciativa

A 8ª Conferência Nacional de Saúde, realizada em 1986, foi o espaço decisivo para consolidar esse projeto coletivo, que seria cravado na Constituição de 1988 com o artigo 196: saúde é direito de todos e dever do Estado. Defender o SUS, desde sua origem, foi também defender a democracia.

Ao longo dessas três décadas e meia, o SUS construiu conquistas concretas que transformaram a vida da população. O Programa Nacional de Imunizações se tornou um dos mais completos do mundo, garantindo acesso gratuito a dezenas de vacinas. 

Continua depois da publicidade

O Brasil se destacou internacionalmente também em transplantes de órgãos, sendo o país que mais realiza transplantes com recursos públicos. A resposta à epidemia de HIV/AIDS, baseada em prevenção, diagnóstico e distribuição gratuita de medicamentos, tornou-se outra referência global.

Além disto, programas desenvolvidos localmente como a política de saúde mental com a criação dos CAPS substituiu gradativamente a lógica manicomial por uma abordagem comunitária. 

O SAMU revolucionou o atendimento de urgência. O programa Farmácia Popular ampliou o acesso a medicamentos. Até a saúde indígena, ainda cheia de desafios, foi reconhecida como política específica, algo inédito em nossa história. 

Continua depois da publicidade

Durante a pandemia de Covid-19, foi o SUS que garantiu a vacinação em massa, que organizou campanhas de prevenção, que manteve hospitais em funcionamento mesmo diante da sabotagem de governos negacionistas. Estima-se que milhões de vidas foram salvas porque existia um sistema público com capilaridade em todos os municípios.

Mas celebrar o SUS é também reconhecer suas contradições. Desde sua criação, o sistema sofre com o subfinanciamento crônico, agravado por medidas como a Emenda Constitucional 95, que congelou investimentos nesta e em outras áreas sociais por vinte anos. 

Esse estrangulamento se traduz em filas, sobrecarga de profissionais e infraestrutura insuficiente. As desigualdades regionais reforçam o problema: enquanto alguns estados e cidades conseguem garantir serviços de qualidade, outros mal dão conta do básico. 

Continua depois da publicidade

Além disso, o SUS convive com riscos permanentes de privatização, seja pela terceirização de serviços essenciais, seja pelo desvio de recursos públicos para planos privados. 

Mais recentemente as emendas parlamentares impositivas retiraram bastante recurso das políticas públicas planejadas e vão sendo oferecidas de acordo com os interesses eleitorais dos mesmos, com raras exceções.

O SUS, porém, é mais que atendimento das equipes multiprofissionais de saúde: é também uma escola de democracia. Desde sua criação, a participação social foi prevista como princípio organizador. 

Continua depois da publicidade

Conselhos e conferências de saúde são espaços de deliberação em que cidadãos, gestores e profissionais discutem prioridades, fiscalizam recursos e orientam políticas. Essa dimensão participativa é fundamental: ensina que saúde não é caridade, mas cidadania ativa. 

Ao mesmo tempo, o SUS consolidou valores que o Brasil ainda precisa aprofundar. Universalidade, integralidade e equidade não são slogans, mas compromissos com uma sociedade que não pode aceitar cidadãos de primeira e de segunda classe.

Pouca gente sabe, mas o SUS projetou o Brasil no cenário internacional. Diversos países do Sul Global buscaram inspiração em nossa experiência para estruturar sistemas públicos.

Continua depois da publicidade

O país se destacou em cooperação internacional em HIV/AIDS, vacinação e atenção básica. Em tempos de emergência climática e novas pandemias, a experiência acumulada pelo SUS é ainda mais valiosa. A saúde não pode ser vista isoladamente: está ligada à segurança alimentar, ao saneamento, à moradia, à educação e ao combate às desigualdades. 

São o que conceituamos como os determinantes sociais das doenças. Chegar aos 35 anos é motivo de orgulho, mas também de alerta. O SUS é uma conquista consolidada e, ao mesmo tempo, uma obra em permanente disputa. 

Cada corte orçamentário, cada ataque ao financiamento, cada tentativa de privatização ameaça não apenas a saúde, mas também a democracia. Defender o SUS é defender a vida. É reafirmar que nenhuma pessoa pode ser descartada, que a vida de uma criança ribeirinha vale tanto quanto a de um executivo da Faria Lima, que um país só pode ser chamado de nação quando garante dignidade a todos.

Continua depois da publicidade

Para os próximos anos, será necessário ampliar investimentos, valorizar os trabalhadores da saúde, apostar em ciência e tecnologia, fortalecer a atenção básica e retomar a participação social plena. Também será urgente enfrentar os determinantes sociais da saúde — moradia, saneamento, alimentação, trabalho digno — sem os quais o SUS isoladamente não pode cumprir sua promessa de universalidade. É preciso que a sociedade se reconheça no SUS não apenas como usuária, mas como defensora.

O SUS é a maior política de justiça social já construída até hoje no Brasil. É ele que garante que cada pessoa, independentemente de sua renda, cor, gênero ou território, tenha direito a ser cuidada. Aos 35 anos, o SUS se firma como projeto de país: inclusivo, democrático e solidário.

Celebrar o SUS é muito mais do que relembrar o passado: é assumir a responsabilidade de lutar pelo futuro. Defender o SUS é defender a democracia, a vida e a esperança de que outro Brasil é possível.

Continua depois da publicidade

Fábio Mesquita é médico, doutor em Saúde Pública, ex-diretor do então Departamento de DST/AIDS e Hepatites Virais do MS, ex-membro do Departamento de HIV/AIDS e Hepatites Virais da OMS por 12 anos, atual Secretário Municipal de Saúde de Guarujá (SP).

Mais Sugestões

Conteúdos Recomendados

©2025 Diário do Litoral. Todos os Direitos Reservados.

Software