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Cotidiano

Incêndio da Alemoa vai custar R$ 3,6 bilhões à Ultracargo

O MP deverá, nos próximos 30 dias, tentar um acordo compensatório com a empresa, antes de promover a ação

Carlos Ratton

Publicado em 29/11/2016 às 13:22

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Incêndio da Alemoa vai custar R$ 3,6 bilhões à Ultracargo / Matheus Tagé/DL

Pouco mais de R$ 3,6 bilhões (exatos R$ 3.620.134.230,27). Esse é o valor mínimo que deverá ser pago pela Ultracargo pelo incêndio em seu terminal na Alemoa, ocorrido em abril de 2015, numa futura ação civil pública, movida a partir de fevereiro, pelo Ministério Público (MP) de Santos.

A ação não inclui os reparos e as regularizações realizadas pós acidente pela empresa, que já manifestou o desejo de pagar menos de 1% do valor estimado (R$ 36 milhões).

O MP deverá, nos próximos 30 dias, iniciar tratativas para um acordo compensatório com a empresa antes de promover a ação, que pode envolver obrigação de fazer, de não fazer e de reparação de danos.  

Laudo definitivo

O valor é resultado de um laudo definitivo, apresentado ontem de manhã pelos promotores de Justiça Daury de Paula Junior, Flávia Maria Gonçalves e técnicos, do Grupo de Atuação Especial de Defesa do Meio Ambiente – Gaema, acompanhados pelo procurador do Ministério Público Federal (MPF), Antônio José Donizetti Molina Daloia.

O acidente, segundo o professor Élio Lopes (um dos técnicos responsáveis pelo laudo), ocorreu por falhas operacionais e estruturais da Ultracargo, que teria sido “negligente e imprudente” na operação do terminal. Conforme detectado, uma bomba explodiu após uma queda de energia, cuja retomada provocou um sinistro conhecido tecnicamente como explosão de vapor em expansão de líquido (Boiling Liquid Expanding Vapor Explosion – BREVE).

A bomba não estaria ligada ao sistema supervisório do terminal, responsável por interromper a passagem de combustíveis para os seis tanques atingidos, dos 13 que existiam na área, que permitia o armazenamento de 80 mil metros cúbicos de produtos. No momento do acidente, tinham 47 mil metros cúbicos de combustíveis.
Não foi descartada falha humana, visto que os equipamentos são manuseados por técnicos da empresa.

Empreiteira

Conforme Lopes, está totalmente descartada a possibilidade de uma falha da empreiteira que estava trabalhando com lixadeira no terminal, gerando fagulhas, visto que, na explosão, um fragmento de 20 quilos da bomba foi encontrado próximo do local em que foi iniciado o acidente.

“Detectamos ainda diversas falhas de equipamentos e procedimentos de segurança, a ponto da brigada de incêndio ter dificuldade de entrar em uma sala para pegar os equipamentos de proteção individual (EPIs) por a chave não estava no local adequado”, detalha o professor.

Ele enfatizou que as falhas envolveram ainda vulnerabilidade da área do incêndio; ineficiência no combate; falta de interligação das bombas; tempo de atuação e de sistema.    

Danos

Os técnicos revelaram que os danos envolveram a poluição do ar, água, solo, subsolo, fauna e flora. Numa estimativa básica, foram nove toneladas de peixes, num grupo de 145 espécies (sete ameaçadas de extinção). Além do mar, o acidente envolveu rios e córregos do entorno, vegetação nativa e outras espécies de animais pertencentes à cadeia alimentar.

O Gaema calculou os danos ambientais ocorridos dentro e fora do Estuário Santista. O oxigênio do mar de área de 8,5 quilômetros de extensão foi prejudicado.

Os cálculos foram baseados em métodos e estudos nacionais e internacionais. O laudo faz parte de um inquérito de cerca de oito mil páginas e servirá como ferramenta da investigação criminal, ainda em andamento na Polícia Civil.

Promotores afirmam que as notificações já foram expedidas

O promotor Daury de Paula disse que as negociações com a Ultracargo ocorrem há um ano, principalmente com relação à comunidade de pescadores.

“Os valores oferecidos pela empresa são muito aquém dos obtidos pelo laudo. As negociações serão baseadas nesse laudo, nos novos parâmetros de licenciamento e correção das inconformidades encontradas, para evitar novos acidentes”, disse o promotor, alertando que as notificações à empresa já foram expedidas, que uma futura ação poderá durar cerca de 10 anos e envolverá todas as empresas ligadas que operaram no terminal da Ultracargo.

A promotora Flávia Gonçalves disse que o laudo não põe dúvida de que o incêndio ocorreu por conta do rompimento da bomba. “Os R$ 3,6 bilhões servirão como base inicial do acordo. Porém, pelas tratativas anteriores, a possibilidade de um acordo é bem improvável. Mas o MP tem como postura abrir negociação antes de entrar com uma ação”, revelou.

O procurador Antônio José Daloia disse que o MPF está acompanhando o trabalho desde o início, junto com vários técnicos, visando avaliar tudo o que ocorreu e os riscos pós incêndio. “Pedimos auxílio para todos os pescadores por intermédio do Ministério do Desenvolvimento Social, trouxemos um antropólogo e ainda pedimos a revisão da segurança dos terminais”, revelou Daloia. Num primeiro levantamento, 465 pescadores foram prejudicados.

Nove dias de fogo

Em 2 de abril de 2015, enquanto os santistas preparavam a celebração da Páscoa e milhares de turistas desciam pelas estradas da Serra do Mar, tinha início o incêndio no terminal da Ultracargo, na entrada de Santos. As chamas ganharam grandes proporções, houve explosões, atingindo tanques de armazenagem de produtos químicos e o fogo durou nove dias até que fosse totalmente debelado. Foi o segundo incêndio mais longo do Mundo.

Mais de 200 bombeiros e brigadistas trabalharam em Santos. Eles usaram mais de 5 bilhões de litros de água e todo estoque do País de Líquido Gerador de Espuma (LGE), produto aplicado no combate às chamas. Além disso, o acidente interrompeu o acesso de caminhões e trens ao Porto de Santos, levou à morte de toneladas de peixes e trouxe impactos para a vida de milhares de pessoas que moravam em bairros próximos ao terminal.

O Terminal Químico de Aratu/Tequimar, do Grupo Ultracargo, já pagou à Cetesb R$ 16 milhões de multa por danos ambientais causados pelo incêndio. A penalidade original imposta, de R$ 22,5 milhões, teve um desconto de 30% com base na lei federal 6.514, de 2008, que prevê este benefício sempre que o autuado efetuar o pagamento no prazo legal de 10 dias.

A Tequimar foi multada por lançar efluentes líquidos no estuário de Santos, em manguezais e na lagoa contígua ao terminal, e emitir efluentes gasosos na atmosfera, o que colocou em risco a segurança das comunidades próximas, aos funcionários e à outras instalações localizadas na mesma zona industrial, além de ter provocado a mortandade de milhares de peixes no estuário e no rio Casqueiro, prejudicando a pesca na região.

Além de pagar a multa, a empresa também teve que promover, por exigência da Cetesb, melhorias em suas instalações para obter a licença ambiental necessária para a substituição, adequação ou reforma das instalações e tanques de armazenamento de produtos químicos perigosos.

Ultracargo

A Ultracargo informa que acompanhou e colaborou ativamente nas investigações sobre o incêndio em Alemoa-Santos, que foram conduzidas pela Polícia Técnico-Científica do Estado de São Paulo com a participação das demais autoridades competentes e resultaram em relatório não conclusivo a respeito de possíveis causas para o incidente.

Independentemente da determinação das possíveis causas, a Ultracargo se dedicou à identificação de medidas possíveis de mitigação de riscos e apresentou às autoridades competentes um projeto abrangente de aprimoramento dos planos de prevenção e combate a incêndios, que prevê a implantação de estruturas e processos significativamente mais robustos que os exigidos pelas leis e normas vigentes. Esse plano foi aprovado e está em fase de implementação.

A Ultracargo informa que está em diálogo com o Ministério Público buscando um acordo para implementação de ações objetivas para mitigar eventuais impactos decorrentes do incêndio e continuará colaborando com as autoridades.

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