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Cotidiano

Denunciado esquema de ‘chequinho’ na Prefeitura de Santos

Reportagem do Diário aponta denúncia de esquema de pagamento a possíveis apoiadores do Governo Paulo Alexandre Barbosa (PSDB)

Carlos Ratton

Publicado em 04/02/2016 às 08:00

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Esquema dos ‘chequinhos’ vem ocorrendo em várias secretarias, segundo denúncia / Luiz Torres/DL

O Diário do Litoral descobriu um esquema quase que institucionalizado, montado na Prefeitura de Santos, envolvendo a maioria das secretarias municipais, que paga mensalmente dezenas de apoiadores do Governo. Entre os ‘chequinhos’, como ficaram conhecidas as pessoas beneficiadas, estão líderes de bairro, assessores de vereadores, comerciantes, profissionais liberais, colaboradores de campanha, formadores de opinião e até dirigentes do Santos Futebol Clube. A Prefeitura nega possíveis irregularidades.

O recebimento acabou batizado de ‘chequinho’ em referência a uma antiga forma de pagamento de cachês de artistas em cheques. O Diário conseguiu o depoimento de uma pessoa beneficiada pelo esquema e de um ex-colaborador de campanha do prefeito na condição de não revelar as identidades. No entanto, o esquema mantido até então nos corredores do Paço José Bonifácio se ratificou por intermédio do vereador José Lascane, do próprio partido do prefeito (PSDB), e pelo depoimento do presidente do Sindicato dos Servidores Públicos Municipais de Santos (Sindserv), Flávio Saraiva.

O esquema ocorre da seguinte forma: o colaborador entrega à Prefeitura o RG, CPF e número da conta corrente. A cada 30 dias, são depositados valores em dinheiro que vão de mil a R$ 2 mil como se o próprio beneficiário o fizesse. No envelope, onde se define quem é o depositante, coloca-se ‘o mesmo’. Não há contrato formal, mas muitos trabalham regularmente na Prefeitura, submetendo-se à hierarquia do funcionalismo público.

É o caso da denunciante, Maria da Silva (nome fictício), que trabalhou neste sistema entre junho de 2014 e novembro de 2015, recebendo regularmente cerca de R$ 1.500,00 por mês.

“O depósito é feito de forma como se eu mesma efetuasse. Há um cabide de emprego muito grande e isso ocorre em todas as secretarias. Tem pessoas que trabalham em dois lugares distintos – em um como comissionado e no outro como ‘chequinho’. O valor depende do ‘padrinho’ e da capacidade de liderança”, revela Maria, alertando que foi ameaçada de perder o dinheiro por se recusar a se filiar a um partido político que dá sustentabilidade política ao Governo.

Colaborador

Ligado ao Governo desde 2013 e à campanha de Paulo Alexandre Barbosa desde 2012, outro denunciante, Alfredo de Souza (nome fictício) explica que há contratados pela Lei 650 e também os que recebem por intermédio de recibo de pagamento autônomo (RPA). “Mas os ‘chequinhos’ envolvem dezenas de pessoas. Essa forma de contratação é ilegal e a Administração é consciente disso. Os secretários e chefes de departamento podem sugerir contratações e indicar pessoas, mas tudo acaba sendo definido e autorizado pelo Gabinete”, afirma Souza.

Alfredo Souza alerta para a demanda trabalhista que o sistema deverá proporcionar, visto que é fácil juntar provas do trabalho. Ligado a vários ‘chequinhos’, ele vai além: tem ‘chequinho’ que recebe em casa como prêmio especial por acordo político. Há valores que são depositados na conta de parentes. A modalidade é uma verdadeira moeda de troca política. Os ‘chequinhos’ são como ‘cabeças de bacalhau’ – todos sabem que existem, mas nunca viram nenhuma. O problema é ainda mais grave: de onde vem o dinheiro para os pagamentos? Como isso é contabilizado?”, finaliza.

Procurada ontem pela Reportagem, a Administração Paulo Alexandre Barbosa, em nota, refuta a denúncia e a reafirma que os pagamentos de profissionais autônomos são feitos nos termos da lei.

Lascane cita ‘chequinho’ na Câmara

Não é preciso muito esforço para confirmar o esquema. Na 78ª sessão da Câmara de Vereadores, realizada em 10 de dezembro último, o vereador governista José Lascane (PSDB), numa discussão acalorada com outro vereador, disse: “É muito difícil ser base do governo porque tem suas benesses. Repito e registro: eu não tenho nenhum, absolutamente ninguém, contratado por qualquer tipo de lei 650, ‘chequinho’ ou o que for”. As palavras do vereador estão registradas e gravadas no Legislativo à disposição de qualquer cidadão. A gravação também pode ser acessada pelo site da Câmara.

Procurado pela Reportagem ontem, Lascane disse que sua posição na Câmara foi uma espécie de desabafo por conta de três vereadores terem citado os ‘chequinhos’ entre as vantagens de ser da base aliada.

“É só verificar nas atas. Eles diziam que a base aliada gozava de benesses ou tinha contratados por ‘chequinhos’ ou cargos de livre provimento, sendo obrigada a votar até em matérias que não concordava. Eu não concordo com a generalização, e a quantidade de denúncias sobre isso no plenário ultrapassou meu grau de indignação”, confirma Lascane, ressaltando que o comentário é que isso ocorre na Administração.

Ouça um trecho da fala do vereador ao DL clicando aqui.

Lascane disse que continuará apoiando o prefeito Paulo Alexandre, mas que após o Carnaval pedirá uma audiência para debater a questão que ele acredita ser muito grave. “Vou perguntar ao prefeito se isso existe e como funciona. Investigar é difícil. O prefeito nunca mentiu para mim”, finaliza o vereador.

Assista:

Imagens: TV Câmara/Câmara Municipal de Santos

“Isso é uma bandalheira”, afirma sindicalista

O presidente do Sindserv, Flávio Saraiva, afirma que o esquema não é novo. “No governo Paulo Alexandre, aumentou. Procuramos pela Lei de Transparência, consultamos o Tribunal de Contas e não conseguimos destrinchar esse esquema perverso, que burla as leis trabalhistas e que só favorece centenas de apoiadores. Alguns ‘chequinhos’ falam para a gente que têm medo de perder o dinheiro”, afirma Saraiva.

O dirigente sindical alerta que as pessoas que se submetem ao esquema não têm noção que estão, na verdade, sendo lesadas. “Não tem direito trabalhista. A administração pública deveria ser a primeira a cumprir as normas constitucionais brasileiras. Se o contribuinte tentar saber quantos e quem são essa pessoas, vai se decepcionar, pois não há como pegar, pois quem indica comete o mesmo crime do que aceita os pagamento. Isso é uma bandalheira que está correndo solta na Prefeitura de Santos”.

Flávio Saraiva confirma a existência de pessoas que recebem em casa e que existe um forte esquema partidário por trás do sistema. “O Sindserv já solicitou várias vezes informações da Administração, que por sua vez as sonega. No entanto, em cada setor que visitamos encontramos um monte dessas pessoas (chequinhos). Pergunto: qual a lei deste país que permite que a Administração Pública contrate sem concurso, sem contrato, sem nada?”, finaliza.

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