Cotidiano

Cidades da Baixada Santista destinam menos de 1% para Cultura

Sem ser considerada área estratégica, poder público restringe investimentos no setor artístico em todas as esferas

Rafaella Martinez

Publicado em 17/07/2016 às 11:00

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Palácio Gustavo Capanema que já sediou o Ministério do Cultura e hoje abriga a Funarte - foi ocupado por artistas em maio contra a extinção do Ministério da Cultura / Tânia Rego/Agência Brasil

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A pasta de Cultura é uma das que possui o menor orçamento do Governo Federal. E a situação alarmante se repete também no âmbito Estadual e Municipal, com constantes reduções e falta de recursos. Na Baixada Santista, com exceção de Santos e Cubatão, todos os municípios investem menos de 1% do orçamento total para o setor.

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Os poucos investimentos dificultam os programas para a profissionalização dos artistas e o fomento às produções independentes, além de formação de público com a descentralização e manutenção de teatros, museus e espaços alternativos.

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Itanhaém aumentou em pouco mais de R$ 100 mil o repasse para a pasta de Cultura em 2016. O orçamento específico prevê R$ 1.471.000,00 para a pasta, o que equivale a apenas 0,41% do orçamento total do município.

A Administração informou que com a conclusão de obras descentralizadas que estão previstas para o segundo semestre há a perspectiva de ampliar a realização de eventos ligados as artes e a cultura.

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Em Mongaguá também houve aumento no valor da pasta para o exercício de 2016. Foram destinados R$ 1,1 milhão (o que equivale a 0,55% do orçamento total). A Secretaria de Cultura de Mongaguá afirma que todos os eventos previstos no Calendário Oficial estão mantidos.

Em Santos, o orçamento da Secretaria de Cultura para o ano de 2016 foi de R$ 33.782.000,00 (o que representa 1,65% do total da administração direta). A Prefeitura afirmou que não houve cortes e nenhum serviço ou evento do calendário oficial da Cidade deixou de ser realizado. No entanto, de acordo com o decreto 7447, publicado no Diário Oficial do dia 21 de maio último, que trata das restrições de despesas, ficam suspensas em 2016 as despesas com eventos culturais, turísticos e esportivos não incluídos na programação oficial do Município.

Guarujá foi o município que registrou a maior queda no orçamento da pasta em relação aos anos de 2015 e 2016: o impacto foi da ordem de R$ 530 mil. A Secretaria Municipal de Cultura de Guarujá informou que o orçamento para a pasta em 2016 foi R$ 6.537.000,00 (0,45% do total orçamentário).

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De acordo com a Administração, a redução do orçamento incide na priorização das ações voltadas para a formação artística e cultural, com a manutenção dos cursos. No próximo ano, haverá editais do Fundo Municipal de Cultura que irá beneficiar todos os segmentos de cultura. O foco também será na realização de grandes eventos com parcerias vindas de instituições privadas, além dos governos Federal e Estadual.

 O orçamento destinado para a pasta de Cultura em Praia Grande no ano de 2016 também registrou queda quando comparado com a gestão 2015. Dos R$ 8.043.188,00 destinados para a cultura (o que equivale a 0,64% do orçamento total do município), cerca de R$ 4,6 milhões são investidos na realização de eventos e R$ 3,3 milhões destinados para a folha de pagamento dos servidores da pasta.

A Prefeitura de Praia Grande informou que não houveram cortes de eventos relacionados à queda de arrecadação ou à crise econômica. Disse ainda que, por precaução relacionada às exigências da legislação eleitoral, deliberou por deixar de realizar alguns eventos previstos para o segundo semestre de 2016, como as comemorações do Dia do Rock e a Festa das Tradições.

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Cubatão reduziu o repasse para pasta na gestão 2016. De acordo com o lei municipal 3776/15 foram destinados R$ 13.178.000,00 para a Cultura, o que equivale a 1,37% do orçamento. De acordo com a Administração, a queda reflete a necessidade de contenção das despesas, decorrente da já prevista diminuição no montante arrecadado neste ano.

A Administração afirma que as perspectivas para o restante do ano são de continuidade na manutenção das atividades culturais, uma vez que a queda na arrecadação não é tão sentida no setor, pois muitos projetos são mantidos ou realizados com patrocínios possibilitados pelas leis de incentivo cultural.

Bertioga reduziu em R$ 12 mil o valor do orçamento para a Cultura em 2016 em comparação com o ano passado. A pasta recebeu aporte de R$ 1,58 milhão (0,5% do orçamento total do município). A Administração destacou que esses recursos destinam-se as atividades e projetos de cultura, sem considerar despesas com pessoal e equipamentos, tendo em vista que  esses recursos estão incluídos no orçamento do gabinete da Secretaria de Turismo, Esporte e C­ultura.

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São Vicente também registrou contingenciamento no repasse para o setor, mesmo com o crescimento no valor do orçamento geral da cidade: na gestão 2016 foram repassados R$ 7.855.000,00 (o que equivale a 0,78% do total da administração direta) para a pasta.

Com relação à investimentos, a Secretaria de Cultura (Secult) informou que mantém equipamentos e equipe. Os cortes foram na realização de eventos e na contratação de profissionais e serviços. As Oficinas Culturais continuam funcionando com os chefes de departamento e diretores da Secult assumindo também a função de professores, além de professores voluntários e parcerias com o Governo do Estado.

Procurada, a Prefeitura de Peruíbe não respondeu aos questionamentos da Reportagem até o fechamento desta edição.

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MinC tem menor orçamento em 9 anos

A participação da indústria cultural brasileiro no Produto Interno Bruto (PIB) varia de 1,2% a 2,6%. Na última década, o mercado formal de trabalho da indústria criativa totalizou 892,5 mil profissionais dos setores de cultura, consumo, mídias e tecnologia, uma alta de 90% no número de trabalhadores, bem acima do avanço de 56% do mercado de trabalho brasileiro no mesmo período. Os dados constam no Mapeamento da Indústria Criativa no Brasil, com base nos anos de 2004 a 2013, e divulgados pela Federação das Indústrias do Rio de Janeiro (Firjan), em 2014.

Embora o número soe expressivo, os repasses para o setor registram quedas anuais. No plano federal, o MinC tem um orçamento de R$ 2,3 bilhões - um valor alto à primeira vista, mas que alcança apenas 0,67% do orçamento da União.

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Em comparação com o orçamento de 2015, houve queda de mais de 21% especialmente nos gastos discricionários (despesas não fixas). O valor caiu de R$ 629 milhões para R$ 604 milhões - o menor dos últimos nove anos. Descontadas as despesas de manutenção de equipamentos culturais, sobram R$ 240 milhões para o MinC investir em editais, prêmios, e seminários, por exemplo.

De acordo com a assessoria de imprensa do Ministério da Cultura, as prioridades foram as ações de funcionamento e manutenção dos espaços culturais. Os demais projetos finalísticos foram interrompidos ou paralisados momentaneamente em função dos contingenciamentos orçamentários.

O déficit afeta as ações das sete entidades vinculadas ao MinC. Por nota, a assessoria de comunicação da Casa de Rui Barbosa informou que atualmente não tem problemas de repasse federal e que não tem débitos pois as despesas foram ajustadas. Destacou ainda que nenhum serviço prioritário foi afetado.

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O repasse federal para a Fundação Nacional das Artes (Funarte) registrou queda de R$ 8 milhões em comparação com 2015. Foram priorizados os recursos para a programação dos espaços administrados pela Funarte. Todos os prêmios da entidade registraram cortes de aproximadamente 40% em relação aos anos anteriores.

As demais entidades vinculadas ao MinC não responderam os questionamentos da Reportagem.

Queda compromete ações do Estado

No Estado, a pasta cultural corresponde a R$ 493 milhões ou 0,23% da receita do governo. Com a queda de R$ 84 milhões no orçamento em comparação com o ano de 2015, a pasta enfrenta as consequências da contenção de verbas.

A assessoria de imprensa da Secretaria de Cultura informou que a redução do orçamento foi resultado da crise econômica nacional que afetou a arrecadação do Estado. Diante dessa realidade e da necessidade de gestão responsável dos recursos públicos, as Organizações Sociais parceiras da Secretaria realizaram ajustes administrativos a fim de minimizar o impacto da crise à população. Desta forma, todos os programas da Pasta foram mantidos, com limitações orçamentárias.

Vários equipamentos passaram por mudanças na gestão, com demissões e reduções significativas no número de exposições. Exemplo disso é a desativação de seis das 21 unidades (uma na capital e cinco no interior) das Oficinas Culturais, administradas pela Organização Social Poiesis.

Com orçamento de R$ 30 milhões este ano, o ProAC Editais - uma das modalidades do programa de incentivo à cultura – manteve o número de editais publicados e valor nominal dos prêmios. Para manter o atendimento a todos os segmentos culturais beneficiados, foi necessário ajustar o número total de projetos contemplados.

Um exemplo da falta de verba para administrar equipamentos estaduais acontece em Santos. Após amplo processo de reforma, que durou 27 meses e consumiu R$ 10,6 milhões, a Secretaria de Cultura do Estado de São Paulo ainda não tem recursos para dar início às atividades.

Série DL Cultura

Por não ser considerada uma área estratégica, o setor Cultural brasileiro sofreu duros golpes nos últimos meses, com atrasos nos repasses de editais, encerramento de atividades, fechamento de oficinas e até mesmo a extinção momentânea do MinC.

Criado em 1985 e reestruturado em 2013, o Ministério da Cultura permaneceu oito dias extinto por decreto do presidente interino Michel Temer.  Durante esse tempo, o Minc ficou vinculado ao Ministério da Educação (MEC), passando ao status de secretaria.

A retomada do Ministério só foi possível após a ­articulação da classe artística nacional, que se uniu em uma série de protestos pelo País. E é justamente por conta do contraste entre as constantes quedas nos orçamentos para a pasta e a força das mobilizações de artistas independentes que o Diário do Litoral começa neste domingo uma série de reportagens especiais sobre a Cultura e as manifestações artísticas existentes na Baixada Santista.

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